Dia 3 - de Fillobal a Melide
O dia começa com um pequeno almoço a inglesa, para condizer com as condições atmosféricas: céu nublado e frio, frio bastante para me fazer desejar ter trazido mais roupa que uns calções, uma t-shirt e um impermeável. Estão 15 graus, contrastantes com os dias anteriores. Também estou a 950m de altitude, e vou baixar aos 400m (o que nao ajuda ja que não se pedala para aquecer)
Por isto mesmo e pelo cansaço que começa a acumular se, o início da aventura de hoje foi apenas as 8:30h
As descidas foram feitas numa velocidade incrível. O caminho era íngreme, largo e com piso duro, rapidamente cheguei a Triacastela, onde fica uma das divisões mais difíceis de optar do caminho.
Ha duas variantes: uma mais curta e mais dura, por San Xil, outra por Samos, mais longa 6 km ate a intersecção em Aguiada, e mais suave. Esta última passa pelo mosteiro de Samos, e diz se que a visão do mosteiro vale a pena o desvio maior. Dito e feito, foi por onde escolhi ir. Nesta altura, apanham me o Angel e o Danny. Se o Angel já me tem acompanhado desde o primeiro dia, o Danny acabou por se juntar pois também ia fazendo o caminho sozinho desde Burgos.
O caminho até o mosteiro de Samos é feito em ligeira descida, interrompida por alguns lances a subir. Li algures que o caminho de Santiago francês tem 3 diferentes estados, consoante a etapa: a Vida, caracterizada como uma constante crescente saindo de S. Jean Pied de Port até ao topo aos Pirineus, atingindo o auge, e uma decrescente ate Pamplona, a Morte, atravessando a meseta espanhola toda, e o Renascimento, entrando na Galiza com as suas subidas e descidas constantes. Nao sei se esta alegoria está correta na minha mente, mas fico feliz por ter apanhado tanto a meseta como a entrada na Galiza com os constantes sobe e desce.
Passado alguns quilómetros dominados por vales verdes cheios de castanheiros, surge no horizonte o mosteiro de Samos. Que visão! É imponente, imerso num verde contrastante com a pedra castanha escura do mosteiro. Não ha muitas palavras para descrever a beleza e a paz que rodeiam este local.
Seguimos viagem, e o verde acompanha nos, bem como a descida ligeira alternada com as subidas até Sarria. Antes de chegarmos lá, fizemos uma paragem num dos locais mais pitorescos do caminho, um pequeno sítio chamado Fonte das Bodas, em que a proprietária além de cozinhar uma tortilha excelente, preservou a memória dos antepassados, mantendo imensos elemento históricos como roupa, mobília, e a própria casa, do tempo da sua bisavó. Segundo ela, a casa terá a volta de 150 anos. Incrível como conseguiu, apesar de segundo ela ser a casa de 8 irmãos, manter intacta tanta história geração após geração, e sobretudo conservada o mais próximo possível do original, ou possível de ser restaurado ao seu estado original. A casa nao tem luz elétrica nem canalizações imbutidas na parede, é tudo exterior para nao estragar a traça original. A mobília está restaurada, e sobretudo as camas muito corretamente ampliadas (antigamente eram todos mais pequenos
), de modo a poder ser utilizada hoje em dia, como albergue. A própria roupa de cama tem mais de 50 anos, segundo a senhora. Fiquei com vontade de regressar no tempo e passar ali uma noite, deve ser uma óptima experiência.
Após Sarria, o percurso sobe um pouco para após Ferreiros começar uma série de descidas inclinadas, boas para elevar o ritmo cardíaco com a adrenalina, até Portomarin.
Em Portomarin e nesta altura de seca, o rio Minho deixa a descoberto o que resta da antiga cidade medieval submersa algures em 1960. A visão é triste e espetacular, um misto de sentimentos.. A albufeira, lugar de muitos barcos, agora é um riacho, e os barcos repousam na margem, mais ou menos bem encostados.
Desde Sarria que o caminho passou a estar muito mais lotado, por ser a distância mínima que os peregrinos precisam fazer para obter a Compostela. E isto notou se na forma como as cidades maiores como Portomarin estão totalmente lotadas, e o almoço acabou por ser improvisado num supermercado. Coisas do caminho.
Com o estômago satisfeito, foi tempo de iniciar a subida desde Portomarin (350m) ao alto do hospital (700m). Nesta altura, e decorrente do fluxo de peregrinos aumentar exponencialme, apenas consegui reservar sítio para dormir em Melide, a 35km. Com nesta altura 55 km nas pernas, arriscava me a ser a etapa mais longa, e o que eu nao sabia, com mais altimetria. O sobe e desce da Galiza engana bastante...
O Angel acompanhou me nesta decisão, o Danny que entretanto tinha ficado para trás decidiu procurar albergue pouco mais adiante de Portomarin.
A tarde foi assim longa, atravessando pequenos povos rurais e passando por trilhos rodeados de vegetação, quais túneis verdes. Neste troço, e após subir ao alto de Hospital, foi tendencialmente a descer e nesta altura ignorei totalmente as alternativas para bicicletas, que se destinam sobretudo a bicicletas que nao sao aptas para BTT. A alternativa apresentada é parte da Eurovelo3, que é uma rota para ciclistas de estrada que vem desde a Bélgica até Santiago. Pois bem, o que eu quero é monte. Só quando o monte for muito agressivo, sobretudo a subir, é que posso considerar a estrada.
Após longos quilómetros, repletos dos ja habituais sobe-desce, cheguei juntamente com o Angel a Melide, naquela que foi a etapa com mais km e mais acumulado, e a par da anterior, com mais beleza. Fomos comer a uma pulperia um dos famosos polvos, e que bem que nao desilude! De barriga cheia, amanhã teremos a sobremesa, que é um doce de 56 km ate Santiago. Se bem que o doce pode ser algo indigesto, pois dizem que o sobe e desce é mais acentuado após Melide. Amanhã confirmo..
Um resumo do dia:
7:09h de pedal
1729m de desnível positivo
95 km
3706 kcal gastas