Em “Verbier” este bravo consagrou-se…
O poeta Friedrich Von Hardenberg Novalis escreveu o seguinte “Todos os acasos da nossa vida são materiais de que podemos fazer o que quisermos. Quem possui muito espírito faz muito da sua vida - cada tomada de conhecimento, cada acontecimento seria para ele inteiramente espiritual - um primeiro membro de uma série infinita - o início de um romance infinito”, pois foi exatamente assim que a minha relação com “Verbier” começou.
A ideia de ir a “Verbier” não é de agora, aliás esta começou a ganhar forma quando há cerca de um ano atrás por mero acaso fui contatado por um “user” aqui do fórum que indagava sobre os meios de transporte existentes para chegar a uma das mecas do BTT aqui nas Terras Helvéticas. Como diz o “pobo” “abençoado sejas tu RTC” pois graças a ti pude disfrutar de paisagens que ficarão gravadas para todo o sempre.
Rolar em “Verbier” é um pouco como aceder ao paraíso, toda a gente almeja “franchir” essa porta, mas somente alguns terão esse privilégio e eu considero-me um desses afortunados.
Após quase duas horas de comboio eis-me chegado a “Le châble” (826 mts), ponto de partida da minha aventura. Aqui colocou-se a questão de decidir se subia a “Verbier” (1.550 mts) via estrada (como é do vosso conhecimento, adoro fazer estrada, eheheh…) ou se optava pela utilização dos teleféricos. Como não podia deixar de ser, prevaleceu a meu ver a decisão inteligente, para além de que o fator tempo tem sempre um peso superior aos demais.
Após análise do mapa com as diferentes opções de teleféricos, decidi-me que estava na hora de provar a sensação de fazer uma volta quase sempre a descer. Vai daí, decidi-me iniciar a volta no “Col des Gentianes” a 2.950 mts, uma vez que nesse local inicia um trilho ciclável (a descer) que me conduziria à “Cabane Mont-Fort” a 2.457 mts. São cerca de 4,5 kms para quase 600 mts de desnível.
Enquanto congeminava e uma vez que estamos em meados de Julho, achei estranho a quantidade de pessoas que embarcavam nas cabines, munidas ou de esquis ou de pranchas de snowboard. Quando me “appretava” para tirar o bilhete, indaguei e fui informado que a título excecional tinham aberto a pista que fica no “Mont Fort” a 3.330 mts e que no meu caso por ainda existir muita neve, teria de sair em “Les Ruinettes” a 2.200 mts. Esta notícia caiu que nem um balde de água fria, uma vez que durante a semana liguei a saber se os trilhos estavam limpos de neve e foi-me garantido que sim, enfim… Pagar 45 CHF para ficar a meio caminho não é propriamente um bom negócio, estava quase para desistir quando a funcionária me diz que devido ao facto de nesse dia decorrer um festival bovino, com “chegas de bois”, o preço do bilhete seria somente de 20 CHF. Como diz o adágio “há males que vêm por bem”, eheheh…
À medida que o teleférico subia, ia-me extasiando com a beleza das cercanias e pensava cá para mim “és um privilegiado pois vais andar onde muitos já sonharam”. Agora compreendo melhor a sensação que o Neil Armstrong deve ter sentido quando desceu da Apollo 11 e poisou o pé na lua.
Chegado a “Les Ruinettes” a minha próxima etapa seria atingir a “Cabane Mont-Fort”. Embora esta fique apenas a 2.457 mts era mesmo assim necessário atravessar uma zona de sobe e desce permanente, mas de lá tinha a certeza que conseguiria ver o porquê de não poder subir mais alto.
Enquanto subia na direção da “cabane” cruzei-me com (n) “randonneurs” que como sempre me tiravam o “chapeau”, mal sabiam eles o sofrimento em que me encontrava, eheheh… Se visualizarem esta crónica no site BDP, compreenderão melhor o porquê do sofrimento, mas cada um só tem aquilo que merece.
Chegado à “Cabane Mont-Fort” e após uma amena cavaqueira com a malta que indagava sobre os reais motivos que me conduziam a pedalar por locais mais adstritos a caminheiros, resolvi que não podia ficar por ali, tinha de provar a mim mesmo que não vim aqui para “coçar a micose” mas sim para me superar.
Olhando na direção do meu objetivo inicial, vi a existência de um bulldozer que serviu para limpar partes do trilho carregados de neve, pensei para com os meus botões, se ele conseguiu eu também conseguirei, nem que vá à la “patte”. Assim dito, assim feito e passado algum tempo tinha subido mais 100 metros de desnível, tendo-me ficado pelos 2.560 mts. A partir d’aqui embora a tentação fosse muita, o risco de algo correr mal também o era, pelo que decidi refrear “a piriquita”, tendo iniciado a descida que me conduziria à segunda parte do meu périplo.
Esta segunda parte consistia em regressar ao ponto de partida 2.200 mts “Les Ruinettes” e daí abalar novamente para os 2.500 mts (perto da base de “Les Attelas”). Não foi pera fácil, as fotos falam por si, mas as paisagens atravessadas amenizaram a dor da subida.
Chegado à famosa ponte indicada nas fotos e visível no Google Earth, esta faz de fronteira entre os dois lados de “Verbier”, isto é, a Este temos uma paisagem típica de montanha, pura e dura, com muitos calhaus, muita neve e pouco verde, a Oeste por nos encontrarmos a altitudes mais baixas (mas sempre acima dos 2.000 mts) a paisagem é mais amena, com muitos tons de verde. O contraste é tão evidente que julgarmos estar em montanhas diferentes.
Daí o objetivo traçado era chegar a “Croix de Coeur” a 2.178 mts a +/- 10 kms. Deste lado encontrei muitos betetistas enquanto que na vertente Este não cruzei com ninguém (vá se lá saber porquê, eheheh…). Chegado ao destino e uma vez que nesta secção deu para retemperar forças, enchi-me de coragem (tava com a pica) para fazer um pouco de downhill (afinal não sei quando cá volto, daí que temos de “seizar the moment”). A escolha recaiu sobre um trilho de 600 mts com 200 mts de desnível. Não digo que o fiz sempre montado e até em duas ocasiões estive para malhar, mas aí é que reside a beleza do BTT.
Chegado a “Verbier” a 1.550 mts e como ainda tinha de descer até aos 826 mts, foram cerca de 9 kms numa estrada serpenteante onde em muitas secções atingi velocidades superiores a 70 kms.
Eis parte dos registos do dia… (restantes encontram-se na página
Bravos do Pelotão, ver crónica
Nº047).
“Le châble” a 826 mts onde tudo começa (apanhar o teleférico).
A minha fiel amiga tal como eu não sofre de vertigens.”Malheureusement” não pôde viajar no interior. Não gostou muito da posição pois parecia que ia para abate.
Esta seria a via do meu regresso, no total falamos de 9 kms desde o centro de “Verbier” a 1.550 mts e “Le châble” a 826 mts. Agora entendem melhor porque resolvi deixar para o fim este desnível de 725 mts (em estrada não se aprende nada).
Quem vem de “Martigny” (465 mts) tem de passar por este vale. Nesta localidade temos de mudar de comboio e apanhar o famoso “Saint-Bernard Express” que nos conduz até ao “Mont Blanc” (França).
“Verbier” ao centro e acolá ao fundo “Croix de Coeur” a 2.178 mts, onde irei passar dentro de algumas horas. Desse ponto farei o meu regresso à base.
A montanha mais alta chama-se “Grand Combin” a 4.314 mts já muito próxima da fronteira italiana. É visível parte do “Glacier de Corbassière” com os seus 9,8 kms de comprido e 1 km de largura.
Como não podia deixar de ser, para a posteridade.
Esta zona é uma autêntica galeria de arte com várias obras de diferentes autores de renome mundial. Um verdadeiro regalo para os olhos. Ao fundo do lado esquerdo da foto o meu objetivo.
Apaixonei-me por este elefante em cobre e madeira. Foi realizado por Zak Ové em 2011 e chama-se “Elephant walk”. Mais informações sobre este espaço em
www.3-dfoundation.com.
Ao fundo em baixo, várias vacas em fila indiana subiam a montanha. Tive sorte pois nesse dia havia um concurso de “chega de bois” e em vez de pagar 45 CHF pelo teleférico, paguei somente 20 CHF. “Merci a los bois”.
Esta cruz a 2.250 mts não deixa ninguém indiferente.
Por causa da neve e para meu grande desassossego, não pude começar lá em cima como planeado a 2.950 mts; mas por outro lado temos de ver o lado positivo da coisa, assim pude saber o que é subir até aos 2.560 mts. Do lado esquerdo da foto a “Cabane Mont-Fort” a 2.457 mts, próxima paragem.
A prova provada da minha presença. Sabem para que servem as escadas em alumínio? Não, não são escadas de socorro.
Vim d’além e o meu périplo levar-me-á a passar naquela ponte que se vê ao fundo do lado direito da foto.
Aqui tomei a decisão de não baixar os braços e continuar até onde fosse possível. Não esquecer que a estas altitudes, a neve deixa de ser neve e passa a ser gelo, o que dificulta ainda mais a ascensão.
A “Cabane Mont-Fort” vista de um outro ângulo. Lindo, não acham!
Os teleféricos lá continuavam o seu vai e vem. “So far so good”, mas vai ser sol de pouca dura.
Tirei esta foto somente para que tenham uma ideia das dimensões (homem vs ambiente). Assinalado a vermelho, um caminheiro.
Aqueles trilhos ali em baixo são para mim.
Vou descer para depois voltar a subir até à ponte. A beleza da paisagem é de tal forma inebriante que a malta não se chateia com este sobe e desce.
Por pouco não apanhava a “Heidi”. Uma imagem vale por mil palavras.
Um último adeus a esta parte de “Verbier”. Quiçá numa próxima oportunidade com companhia (aceito candidaturas, eheheh…) consiga arrancar do topo (B). Agora vamos atacar a segunda parte. Conseguem ver o teleférico? E dois caminheiros?
Lembram-se da ponte, pois aqui está ela, aliás só se vê um bocadinho. Foi a partir deste ponto que realizei o pequeno filme do “post” 398. Ao fundo no topo, “Les Attelas” a 2.733 mts. Quem desejar pode lá chegar via teleférico ou como eu, via “bike” ou “à la patte”. Neste caso fiquei-me pelos 2.500 mts uma vez que o esforço da subida, pouca alegria me iria trazer.
“Verbier” novamente em pano de fundo. Vou andar a brincar naquela encosta. Aquelas montanhas ao fundo cobertas de neve vão ser alvo de uma aventura.
Poderia ter optado por descer por aqui, mas como diz a publicidade, não era a mesma coisa.
O “berdadeiro” oásis no meio do deserto. Pena não ser “sergas” (está escrito ao contrário por cousa da lei da publixidade).
Estive ali onde neste momento se encontram aqueles 3 “randonneurs”. Estamos na Suíça e não nos Himalaias.
Ainda há pouco estava lá em cima como tão depressa estou cá em baixo, 400 mts de desnível em +/- 1,5 kms.
O meu próximo destino “Croix de Coeur” a 2.178 mts. O trilho é o que se vê na encosta e pelo meio um túnel com +/- 250 mts.
Como constatam a zona é rica em trilhos.
Para os amantes de “downhill” todos os caminhos levam a “Verbier”.
Quando desenhei o “track” tinha planeado uma visita ao outro lado da encosta. Ficará para próximas núpcias, o cansaço não perdoa.
No final da linha optei por descer que nem um “downhilista” (trilho na vertical).
Irei passar no meio daquele aglomerado de casas.
Ao fundo a entrada para o túnel. Impressionante a pouca luz com que os Suíços nos presenteiam, para além do frio que se faz sentir no seu interior.
Foto tirada a partir de “Croix de Coeur”.
Este foi o trilho de “downhill” efetuado, 200 mts de desnível em +/- 600 mts de trilho, pelo que já dá para ter uma noção do grau de inclinação.
Como tirei ao longo da volta +/- 350 fotos, já era de esperar que a bateria da máquina “fosse à vida”, pelo que esta fotografia foi tirada com o telemóvel. Vim d’além, daquele extremo, “Verbier” não mente.
Tempo de regressar à base mas sem “espigas” uma vez que são +/- 9 kms em curva e contra curva.
O famoso “Saint-Bernard Express”, comboio que me conduziria a “Martigny” e aí apanharia outro que me levaria a “Lausanne”.
Na crónica nº28 aquando da minha visita às “Portes du Soleil” afirmei que tinha entrado no paraíso, pois aqui voltei a repetir a dose e anseio por descobrir outro “spot” similar.
No final esta volta ficou-se em 2.130 mts de declive negativo para +/- 38 kms.
Como nota final apenas uma palavra para descrever esta experiência “fenomenal” e se alguém do fórum pensar repetir, que se acuse atempadamente e terei todo o prazer em servir de anfitrião ou simplesmente acompanhar.
Cumprimentos betetistas e até à próxima crónica…
Alexandre Pereira
Um Bravo do Pelotão, neste caso sem…