Sob influência do... calor

lobo solitario

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“Ai qu’eu morro”, gemi com a barriga esticada como nos reclames da Activia. Entrei na modorra.


...



“Tou farto”, pensei, “mais um semestre a aturar aqueles inúteis? Mais vale bater a bota! Esticar o pernil! Dar o peido mestre!”.
Carreguei no icon do programa “MORTE AO ALCANCE DE TODOS” e, depois de aparecer a escolha múltipla “Aceito”, “Rejeito”, “Mais informações”, “Desbloquear mensagens obscenas sobre melhores maneiras de como se referir ao auto-processo fúnebre”, “Actualize o seu obituário” e “escape”, escolhi, iluminadamente, a primeira hipótese: “Aceito”.
Pensando que o processo daí para a frente seria fácil e rápido, sou imediatamente confrontado com uma pergunta: “Escolha a música para o acompanhar ao Além”. “Ao Além?”, espantei-me, “afinal ainda há mais??? Tou f…..eito. Será que ainda é pior que a União Europeia?”. O programa ronronava enquanto esperava a minha decisão. Pensei: “vou armar-me em pseudo-cultivado e escolher um Chopinzinho, ou vou armar-me em velhinho esperto e sugerir uma Jill Tracy?”. A meio do processo de escolha o ecran diz-me, simpaticamente, que o programa desligou inesperadamente e perguntou-me, educadamente, se queria reiniciá-lo. Mandei-o àquela parte e abri uma garrafa de tinto do Douro. Foram precisos quatro copos para ganhar coragem para enfrentar, novamente, os processos informáticos e burocráticos de uma Morte Programada. Apercebi-me da coragem que é necessária para decidir por uma Morte Rápida. Imaginei um tipo de vinte e três anos a cento e oitenta e sete quilómetros à hora na auto-estrada do Sul (vulgo A2) a ter que preencher este formulário em três segundos de modo a poder morrer esmagado contra uma azinheira alentejana como tinha programado toda a sua vida anterior. Admiro-os profundamente. É precisa muita coragem!
Subi e vasculhei no frigorífico uma asa de frango assado de segunda-feira. Ferrei-lhe o dente e decidi-me pela Jill. Afinal o Chopin e a sua marcha fúnebre eram demasiado abusados nas cerimónias funestas. A melodia era porreira mas um pouco batida. Nada como um pouco de mistério. Vamos com a Jill. Cliquei. “Meio de transporte?” perguntou-me o ecran. “Ai o cara…pau!”pensei, controlando a minha tendência para a obscenidade. Estava a começar a ficar irritado. Até parecia que estava na fila para o desemprego. Virei-me, irado, para o monitor e disse, um pouco destemperado: “Vou melhorar as estatísticas e ainda me fazem a vida difícil?!”. Respirei fundo (enquanto podia) e fiz a minha selecção: “bicicleta de montanha” mesmo ao lado das possibilidades “patins em linha” e “foguete no cu”. Quando pensava que estava, finalmente, encaminhada a minha viagem fúnebre eis que surge aquela pergunta sacramental: “Quais os componentes da transmissão?”. Em vez de me irritar outra vez, dei por mim a pensar na fundamentação teórica da pergunta: “Nada mal! Nada mal! Quem fez o programa sabe, afinal, do assunto…”. A resposta foi cuidadosamente pensada. Uma transmissão suave, permitindo uma boa desmultiplicação até lá acima, caso fosse necessário. Na eventualidade de se dar uma descida aos profundos dos infernos, uma talega potente seria importante para abreviar a viagem. A cassette teria de ser uma com 34 dentes para a primeira hipótese. Afinal, já não era um cadáver jovem. A coisa poderia demorar algum tempo a atingir. Em caso de descida infernal, já a transmissão era de menor importância. O que queria era uma suspensão que amortecesse os engulhos a encontrar. O cornudo tinha a tendência para humilhar os condenados com uns OTBs acrobáticos. Subitamente dei por mim a ficar entusiasmado com o questionário e a antecipar ansiosamente o início da Viagem. Quando, finalmente, pensava ter respondido a tudo, surge a mensagem final: “Cartão de Crédito” ou “Empréstimo a vinte anos”? Não há hipótese. Mesmo no after-life, a visão da coisa é economicista. Já devem ter revisto a Constituição do Além depois de Abril de setenta e seis! Já não há mortes tendencialmente gratuitas. Não admira que o pessoal morra cada vez mais velho. Só com o que têm que poupar para entrar no Além…!
Pedindo desculpa às herdeiras, lá dei o número do cartão, prazo de validade (ri-me interiormente quando o fiz) e empresa bancária responsável. Senti-me mais leve.

De início ainda levantei o rabinho do selim mas rapidamente me cansei. Regozijei-me por ter escolhido uma cassette com boa desmultiplicação. Pousei a peida no couro branco e comecei a dar à perna daquele modo resignado de quem sobe à Senhora da Graça. Uma voz melíflua pedia desculpa porque o CD ripado da net com a música solicitada tinha dado o berro. Em alternativa ofereceriam um “best of” do Quim Barreiros. Não seria o melhor ritmo para ascender ao Além mas poderia ser “quite entertaining”. Pedalei céu acima durante muito tempo. Estava já a ter cãimbras quando um anjo passou por mim àbrir. “Ainda falta muito?” perguntei. “É já ali!”, respondeu com um sorriso maroto. “Tou feito com este pessoal…”, pensei. Continuei estoicamente a dar à perna. Afinal, tinha já treinado uns anitos para esta coisa. Passei por uma cegonha com um bebé preso ao bico e perguntei-lhe se tinha pastilhas de magnésio. Logo me arrependi da pergunta ao ver o pobre bicho abrir o bico e deixar cair no vazio a preciosa carga. Percebi, então, o drama de muitas mães que aguardam nove meses para nada… “Que se lixe”, pensei, “ao menos têm desculpa para não saberem preencher o formulário online”.

As cãimbras não sossegavam pelo que decidi parar aos 9000m de altitude. Entretive-me a ver uns alpinistas a lutar contra a North Ridge do K2. “Vão-se preparando para o formulário”, pensei divertido. “Qual seria o seu modo de deslocação?”, interrogava-me. Skis? Sauna? Cornetto de baunilha? Depois de lamber umas nuvens contaminadas de dioxinas com origem na China senti-me melhor e voltei ao pedal. Não me lembro bem quanto tempo durou o esforço hercúleo de chegar ao Céu. Lembro-me vagamente de passar por uns tipos a subir rapidamente em moto-quatro (maricas…) ou em balão. Vi um, com a cara do Carlos Cruz a descer recambiado. Aparentemente, há quem consiga iludir até ao último instante…

Finalmente cheguei. Senti um ar mais leve, mais fresco. Estava no Céu. Pedalei e senti que avançava suavemente, sem esforço. Maravilha. É disto que eu gosto: após um grande esforço, de repente, já se chegou. Agora é só curtir. Vi um tipo velhote, de barbas longas e brancas.
- “A recepção, por favor!” perguntei educadamente.
- “O quê? A recessão? Isso já dura há anos…” respondeu o taralhouco.
Percebendo que falava com alguém duro de ouvido, repeti a pergunta.
- “Ahhh, és novo aqui. Qual é o teu nick?”, perguntou, bem disposto.
- “Lobo Solitário” respondi, afavelmente.
- “Ahhh, já ouvi falar de ti. Não és o gajo que anda com os tipos do CEVA?”, indagou cada vez mais excitado, enquanto se engasgava com a própria saliva e tossia aflitivamente.
- “É!” disse, “não sabia que essas coisas se sabiam cá em cima”.
- “Claro!”, disse, admirado, o agradável velhote.
Chegou-se à minha beira e, encostando as beiças ainda húmidas das secreções recentemente arrancadas à árvore respiratória, disse-me com ar misterioso:
- “O velhote está sempre na Net e passa muito tempo a surfar o Fórum. Diz que gostava muito de ler as vossas passeatas.”
Parou um momento a pensar e, com ar tristonho, confessou:
- “Não vai gostar muito de te ver cá em cima. Cá em cima não se passa nada e não vais ter nada que escrever. Vê lá se te acautelas ou Ele ainda te manda lá para baixo outra vez.”
Arrepiei-me com tal pensamento. Só de pensar na trabalheira que tinha sido chegar lá em cima… Por outro lado, a descida deveria ser louca, louca…
Fiquei ao paleio com o tipo durante um bom quarto de hora até que me lembrei de perguntar quem era ele.
- “Pedro.” respondeu-me humildemente.
- “S. Pedro?”, perguntei admirado, “julguei que seria alguém com aspecto mais velho”, disse.
O tipo transfigurou-se. Parece que não podia ter lançado piropo mais refinado. Tinha ganho um amigalhaço.
- “Quando acabar o meu turno, vamos ali até ao Zé da Adega, na terceira nuvem a seguir à das Irmãs Carmelitas. O gajo tem um vinho de missa que é um assombro”.
- “Ó Pedro”, respondi, “apetecia-me era uma Fanta depois desta subida. Uma Fanta e uma barrita. O tinto já o despachei antes de vir”.
- “Ah, pois, pois” tartamudeou o pobre velhote. “Então vamos ao franchising americano do Céu. Não é a minha parte favorita mas sempre têm Fantas”.
É claro que me arrependi do meu pedido. A cara do gajo metia dó, só de pensar que não tinha desculpa para entornar um caneco. Arrepiei caminho e sugeri meio a medo
- “… ou então um panachêzito. Dizem que hidrata ainda melhor.”
Um sorriso começou a formar-se no seu rosto encarquilhado.
- “OK, meu. Vamos, então, à nuvem da Unicer”.
Com um passo enérgico, próprio de quem já não conhece a força da gravidade há dois milénios, arrancou por ali fora. Dei por mim a saltar novamente em cima do selim branco e a pedalar fortemente para o alcançar.
Sentámo-nos. Eu pedi o tal panaché e o S. Pedro mandou vir um bagacito de Vilaverde.
- “Não há como o bagaço de morangueiro. Dá cá uma moca….”.
Virou-se para mim, muito sério, e perguntou:
- “Então, meu. Já há muito que não ouvia nada de ti. O tipo até pensou que tinhas morrido…”.
- “O tipo?” indaguei.
- “Sim, o das barbas”, disse, piscando-me o olho azul.
- “Ahhh” respondi, meio atarantado. “Então parece que há mais democracia e “à-vontade” no Céu que lá em baixo.”
- “O tipo é porreiro?”, perguntei a medo.
- “Do melhor!”, respondeu o S. Pedro enquanto despachava um cálice de bagaceira minhota.
Mais descontraído, lá me recostei no banco corrido e mandei umas boas goladas de panaché goela abaixo. “Nada mau, não senhor!”, pensei, ao avaliar a qualidade da mistura. Depois de quatro cálices para o Pedrão e duas canecas para mim, a conversa tornou-se fácil.
- “Então pá? Que tens feito ultimamente?”, perguntou-me.
- “Oh Pedro, olha que com o calor não tenho feito grande coisa. No Algarve ainda dei duas voltitas nas falésias e…”.
- “Conta, conta!”, interrompeu-me o velhote.
- “OK, então aqui vai. Já não andava de bike desde a Travessia do Major…”.
- “O quê? Travessia do quê?”, interrompeu-me o velho, insolentemente.
- “Travessia do Major. Uma coisa que eu desenhei e para a qual convidei dois gajos mas que correu meio pró mal”.
- “Então com’assim?” . Os olhos dele ferviam de curiosidade.
Como essas coisas não se contam, nem no Céu, limitei-me a dizer:
- “Eh pá, uma coisa simples. Fomos de Chaves a Coimbra em cinco dias, pelos montes. Pelo menos, dois de nós fomos. O outro tipo fartou-se de me aturar e baldou-se em Arouca”.
Sem parecer muito convencido com a minha parcimónia, lá condescendeu:
- “Conta lá, então.”
Recomecei, então, onde me tinha interrompido.
- “Como já não andava desde final de Junho, por causa do calor, sentia-me sem grande vontade para ciclar”.
- “Queres mais um panaché, meu?”, interrompeu o tipo, que parecia meio distraído desde que lhe mencionara a Travessia. Meio foleiro, lá lhe disse:
- “Tá bem.”
- “Olha aí, mais um panaché e uma bagaceira aqui pró moi”, trovejou S. Pedro pró anjito de serviço às mesas da esplanada. Como me mantinha calado, meio ofendido, o S. Pedro virou-se surpreso e perguntou:
- “Atão? Como foi essa cena da Travessia. Tens fotos”.
O gajo não largava. Queria mesmo saber mais detalhes. Lá lhe resumi a coisa.
- “No primeiro dia de Chaves a Vila Pouca e no segundo até Amarante as coisas rolaram fáceis. Olha aqui uns planos porreiros” e virei-lhe o ecran da Canon.
- "Olh'aqui o Indy a cruzar a seara:"

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- " e o Plus quase abafava depois da subida à Padrela. No dia seguinte já estava fino. Aqui vai ele a descer para lamas d'Olo"

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- "A ligação a Amarante teve de ser mudada à última hora porque deitaram abaixo a ponte que atravessava o IP4."
- "Conheço bem. Já tenho muitos hóspedes que vieram directos daí!" comentou S. Pedro.

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- "Aqui já é no terceiro dia, quando atravessávamos a Aboboreira. Depois, no Montemuro, não tirei fotos. A coisa endureceu e o espírito ficou rançoso..."

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- "No quarto dia já só fomos os dois. De Arouca ao Caramulo e, no dia seguinte até Coimbra, a coisa voltou a rolar melhor. O Plus até pareceu gostar desta parte. Atravessámos Freita e Arada e subimos ao Caramulo. O Plus continuava com o ritual de reparar aquele pneuzão três a quatro vezes por dia. Ele há coisas que não lembram nem ao diabo..." disse, sem pensar e arrependendo-me quase imediatamente ao ver o arrepio do S. Pedro.

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- "O último dia arrancou do alto do Caramulo e foi quase só descer até Mortágua."

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- "Daí para a frente foi tudo novidade. Até deu para encontrar mais uma ponte para a colecção"

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- "A chegada a Coimbra soube bem. Ainda por cima tivemos o JAP a ir buscar-nos de automóvel."
- "O JAP! Também já ouvi falar dele. Gostava de o conhecer..." comentou S. Pedro.
Arrepiou-me, este comentário...
- “E pronto. É isto...” terminei.
- “O quê??? Só isso??? Não houve fait-divers?” Resmungou, desconsolado.
Mantive-me obstinadamente calado. S. Pedro pareceu aceitar e voltámos ao problema dos calores de Verão.
- “... então lá fui eu pró Algarve no fim de Agosto. Não sei se é obediência assustada ou se se trata apenas de coleccionar fichas para poder, mais tarde, trocar por saídas de um dia nos montes. O que sei é que a migração anual ao Sul com a família se voltou a fazer. Mas não gosto. Muito calor...”
- “Então não gostas do calor no Verão?” perguntou-me no gozo. “És mesmo esquisito!” disse, lançando uma gargalhada que fez correr as nuvens mais próximas e chover granizo em Trás-os-Montes, destruindo 10 hectares de vinha.
- “Não sou nada esquisito!” repontei ofendido. “Só não gosto de praxe académica, pepino e música hip-hop...”
- “Não gostas de música hip-hop???” perguntou de olhos arregalados. “Mas essa cena é genial! Foi preciso dois milénios para eu poder curtir o hip-hop e tu não gostas? Olha que é preciso ser genial para compôr aquelas letras!”. Continuava de olho arregalado e eu de boca aberta de surpresa.
Para provar que não era preciso ser génio, respondi-lhe:
- “Olha que escrever aquilo não é assim tão complicado. Olha:
“Não é do meu gosto,
em Agosto,
ter como gosto,
passar as horas a esconder o rosto
dos raios do Sol,
pois que gosto
é dele depois de posto.”
O Pedrão abanava-se todo, entusiasmado com a lírica. Suava enquanto gingava. Mostrava a cinta um pouco alargada, talvez por alguma falta de exercício físico.
- “Ó Pedro. Acho que devias queimar aí algumas calorias do toucinho. Bem podias pedalar lá abaixo de vez em quando e voltar a subir. Aproveitavas e ripavas uns mp3 de hip-hop!”
O tipo amuou imediatamente. Devia ser sensível a questões de peso. Coisas de Pedro.
Para disfarçar lá continuei a fazer conversa:
- “... mas devo confessar que devo ser, realmente, algo esquisito” disse para dar uma na ferradura depois de lhe ter carregado no cravo. “Nas praias apenas se vêm lagartos ao calor, estendendo as suas banhas até à fritura completa. De facto, conforme vão avançando as décadas, mais banha se vê. Elas, após o primeiro parto, coleccionam toucinho e pernil. Mesmo eles, cada vez mais novos, ostentam o seu toucinho dourado ou mesmo torrado. Apenas as lagartixas parecem manter-se mais delgadas mas algumas já se apresentam bem insufladas. Mesmo os lagartos que parecem mais snobes, com lagartixas machos de nomes como Martim e Dinis e as lagartixas fêmeas exibindo um simplesmente Maria, sem aditivos ou santificantes, de idades ainda inexperientes, mesmo esses lagartos exibem toucinho e papada debaixo dos seus óculos intransponíveis e sotaque afectado em troca de banalidades com um sogro, também ele, untuoso. Como depreendes, nem gosto de praia nem da sua fauna... exceptuando, talvez, um ou outro pormenor que não divulgarei!”
Depois desta tirada, S. Pedro lá recuperou o seu bom humor e pediu mais informações sobre as passeatas algarvias.
- “Só dei duas voltas. Um trajecto impecável entre Lagos e Sagres. Na primeira tentativa fiquei-me por Salema mas da segunda cheguei a Sagres” expliquei.
- “Fotos. Mostra mas é as fotos” respondeu ele, impaciente.
- "Olha, esta é nas falésias entre Porto de Mós e a praia da Luz. A descida para a praia tem um single bacano."

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- "Esta é a igreja da praia da Luz. Já agora, Pedro, tu deves saber o que aconteceu à Maddie...?"
O tipo aproximou-se e cochichou ao meu ouvido. Ouvi atentamente.
- "Pois é. Era o que eu pensava..." respondi, pensativo.

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- "Depois foi seguir a costa, com passagem em Burgau,..."

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"... praia de Cabanas Velhas, Forte de Almádena..."

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"...praia da Boca do Rio..."


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"... Salema..."

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"...uma praia só acessível por caminhos de pé posto, Forte da Figueira e praia da Figueira, praia das Furnas..."

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"...praias do Zavial, Ingrina, Barranco, Martinhal... passando por zonas de beleza única."

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"... Tudo até chegar a Sagres."
Visivelmente consolado com o álbum, S. Pedro virou-se para mim e sugeriu:
- “Podíamos ir ali ao Céu dos suínos comer qualquer coisa. Os tipos têm uma avença com o Inferno deles e come-se um entrecosto delicioso, tostadinho, parece um teclado...” e enquanto dizia tudo isto dedilhava os dedos num teclado virtual e engolia a saliva que saltava dentro da sua boca.
- “A ideia parece-me excelente” repliquei, “mas, já agora, que negócio é esse? Então os tipos do Céu não mandam nada pró Inferno deles?”
- “Claro!” respondeu convicto.
- “... e então, o quê?...” continuei curioso.
- “... então que haveria de ser? Não consegues adivinhar?” perguntou, divertido.
Pensei e atirei à sorte:
- “Toucinho do Céu.”
- “Ya Man, tás a ver como sabes!” e escangalhou-se a rir.
Lá fomos à tasca Porco Celeste. Já com a boca reluzente de gordura suína, S. Pedro perguntou:
- “E mais voltas?”
- “Eh pá, dei umas voltinhas lá por Turiz e este sábado passado fui fazer a Rota do Homem com o pessoal”.
- “Boa. Conta. Conta.” disse, dando saltinhos no banco surrado da tasca. À nossa volta formava-se uma multidão de orelheiras atentas.
- “Bem...” respondi, engolindo uma cartilagem meio mastigada, “... não há muito que contar. Metemos a monte Castelo e ao Moinho Velho, tudo queimado e, depois de Portela de Vade subimos a Mixões, sabes, aquela que venera o teu colega António”.
- “Sei, sei” respondeu meio contrafeito. Imagino que devem andar de candeias às avessas, estes dois.
- “Depois de Mixões, onde lhes apresentei um caminho porreirinho, fomos pelo lombo do monte até Cutelo”.
À menção da palavra Cutelo, a assistência de natureza porcina estremeceu brevemente e pareceu-me ouvir um a cagar-se.
- “Entrámos em Cutelo por uns caminhos antigos muito fixes e, pela primeira vez, consegui subir uns degraus desgraçados que lá há”, acrescentei. “Olha, tens aqui umas fotos”

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- “O regresso foi feito pela Geira. Muito bom. O final, então, feito rapidinho, dá cá uma tusa...”

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Neste ponto só se ouvia “oinc oinc” por todo o lado.
- “Foram quase 100Km com mais de dois mil de acumulado”
- “Ena pá, 2000. Isso é muito!” admirou-se S. Pedro.
- “Muito porreiro!” e pisquei-lhe o olho.
Ele olhou em redor para ver se alguém o espiava e piscou-me o olho de volta. Rimo-nos enquanto ele assobiava o rap alentejano.
- “A a a aaatitudi” pareceu-me ouvir de um porco gago, ali ao lado.
Conforme ia aviando mais costelinhas, uma dor de barriga aumentava exponencialmente. A dada altura, as dores eram tantas que gemi: “Ai qu’eu morro”, a barriga esticada como nos reclames da Activia. O intestino grosso contorceu-se aflito e larguei três peidos longos e sonoros. A dor serenou mas o barulho da explosão acordou-me.
“Porra, que raio de sonho. Para a próxima vou ter de comer menos feijoada à brasileira” pensei, ainda estremunhado.
 

RPires

Member
Fónix Major, já estava com saudades!!!!

Esta é das boas, uma verdadeira lufada de ar fresco...
Na pág. do Indy já tinha lido umas coisinhas.


Aqui do Sul, um abraço!
 

Myrage

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Este texto merece um comentário sério . Mas como estou sempre na P*** da palhaçada. Só me ocorre isto: Vai esfregar a Lâmpada ao Pedrão….

Para que os leitores não fiquem com ideias indecentes, decidi partilhar isto:

[video=vimeo;14921473]http://vimeo.com/14921473[/video]
 

bichu du matu

New Member
........................................háháháháhá..................................................................háháháháhá...............................................................................................háháháháhá..........................................................................................................háháháháhá.......................háháháháhá.......................háháháháhá.......................háháháháhá.......................háháháháháháháháháháháháháháhháháháháhááháháháháháháháháháhá.

Bém, quase morria a rir, bém precisava!!! Mas a mulher ouviu o meu engasgo e safou-se a tempo de não ter de suportar qualquer melodia funebre. fico a aguradar por mais, slavou aa minha noite de pesadêlo (6-0) fooooo.....sgas-se.
 

jorgegt

New Member
Simplesmente bestial, vários épicos contados numa narrativa que não consegui descolar até chegar ao fim:-D

Só fiquei curioso com o que o São Pedro segredou ao ouvido sobre o que aconteceu á pobre Maddie:-D

Quanto ao Video até cantarolei com a minha filhota as letras da musica;-)
 

INTERCEPTOR

New Member
Foi-me solicitado que me deslocasse a este Tópico para a sua completa leitura.
Também não acredito que haja alguém que não leia tudo de seguida até ao fim sem parar... só mesmo se lhe der alguma caganeira de tanto rir.
Enfim, muito obrigado ao meu amigo que me passou o link directo e os meus parabéns pelo excelente trabalho e imaginação.
Também tento fazer uns pequenos relatos das minhas voltas mas nunca nada do género.
Julgo que em vez de "bom trabalho" podemos entitular o texto acima como......... um "Dom".

Até breve e manda mais!!
 

SURFAS

New Member
XXXXXiça

Esta parte do fórum até andava desanimado ....

Do melhor, já está na minha agenda para uma próxima oportunidade!!!

Ca raio de bikla é esta do, Plus?? Não é o Oscar??? E os pneus é de avião??

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indy

Member
A Travessia do Major já lá vai há algum tempo. Tinha pensado em dizer algo sobre a recente Rota do Homem mas depois de ler esta soberba crónica não me atrevo a escrever mais nada de substancial durante os próximos 15 dias, pelo menos. Realmente, do melhor, ou talvez mesmo o melhor.

Mas posso sempre contribuir com algumas fotos, que confirmam o que o autor escreveu e permitem que dê também a conhecer a sua formosa (mas nem sempre segura) pessoa :eek:

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24 de Junho, dia de S. João,iniciava-se em Chaves a Travessia do Major. Enquanto alguns recuperavam duma noite de excessos, 3 corpos vergados ao peso das mochilas transpiravam nos caminhos transmontanos.

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Segundo dia da travessia, as coníferas do Alvão animavam a minha disposição matinal.

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Mais para o meio do dia uma ponte destruída obrigava-nos a atalhar. Aqui se confirma que o caminho mais curto entre dois pontos não é, necessariamente, o mais fácil.

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Esta foi uma imagem recorrente, o que prova que... Não sei bem o quê, mas deve provar alguma coisa.

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Terceiro dia. Debaixo dum forte calor, a travessia do Douro marcava também o meio caminho da Travessia.

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Algures por estas bandas algo começou a correr mal, ainda hoje, quando penso nisso, tento perceber o que foi e não chego a nenhuma conclusão. Para mim a Travessia terminou umas dezenas de kms à frente, em Arouca.

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O abandono da Travessia deixou-me de candeias às avessas com o BTT. Para mitigar esse sentimento comecei a castigar o corpo com longas, e por vezes insanas, saídas de roda fina.

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Durante o resto do Verão pouco uso dei às rodas grossas, só pegando nelas mais a sério já nos últimos dias de Agosto.

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Na última sexta-feira um e-mail e um telefonema deixaram-me "muito feliz" (como diria um tipo popular que conheço) e menos de 24h depois já pedalava calmamente nos montes chamuscados de Vila Verde.

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Pelos vistos havia mais gente feliz naquele grupo.

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O famoso Incêndio de Germil, um dos hits noticiosos estivais, tinha queimado uma vasta área...

http://img801.imageshack.us/img801/2049/rotadohomem201002332281.jpg
...mas ainda havia locais onde nos podíamos deixar envolver pela natureza luxuriante. Não há registos fotográficos, pois ninguém esteve para interromper aquela espécie de orgasmo, mas a nova versão da chegada a Mixões e, principalmente, o novo trilho, uma espécie de segredo nacional, dos arredores de Brufe foram qualquer coisa de divinal, pela beleza e pela técnica envolvida.

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O regresso foi pela Geira. Percorrida neste sentido, mais descendente, proporciona outra diversão. Às tantas já parecíamos miúdos com um brinquedo novo.


E assim se passou um grande dia. Como diria o nosso guia, profundo conhecedor da língua-mãe ( :D:D ),
Valē!
 

350plus

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Tal com o o Indy fez, resta-me apenas acrescentar umas fotos para completar esta crónica de uma "morte" encomendada. A TM2010 já vai longe no tempo, mas é sempre bom recordar aquelas horas de "adnalina no aus".

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Rolando nas zonas de vegetação cerrada nos arredores de Chaves.

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As famosas searas fotogénicas.



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Uma abordagem mais calma ao Alvão.

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E já quase lá em cima, seguindo o longo estradão das eólicas.

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Navegação livre até Lamas de Olo.


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Contornando maciços graníticos a caminho do Marão.

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O intrigante caso da ponte desparecida.

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A dura saída de Amarante.

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Combustíveis.



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Para baixo, o Douro.


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Para cima, muito para cima, o Montemuro.

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Má atitude em altitude.

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Freita a jacto

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O que se esconde por detrás daquela curva?

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...a descida das nuvens. A caminho de S. Pedro do Sul

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Já bem perto do Caramulo. O tal que, definitivamente, não fica a seguir àquela curva ali.

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O Caramulinho foi o primeiro convidado do espectáculo de encerramento.

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O Mondego e os seus afluentes continuaram as festividades.

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E Penacova tentou fritar dois ciclistas. Mas felizmente guardamos-nos um pouco no frigorífico antes da coisa azedar.

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E em Coimbra, com 400 km, terminamos a nossa epopeia pelo granito de Portugal.
 
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katitaContessa

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Boas,

Vocês metem inveja a qualquer um! Tenho inveja do vosso espirito!

Continuem assim, é um prazer ler e reler as vossas palavras e ainda ficar a "babar" para as fotos!

Beijos
 

Gun_Hugo_Dale

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Completamente brutalissimo!!

os nomes dizem tudo, Serra da Freita, S. Pedro, Caramulo, pedalar em boa companhia, paisagens arrebatadoras..fotos 5***, cada uma melhor que a outra, espectáculo!!

Temos de arranjar um fim de semana, pessoal do Oeste, organizarem-se e fazer uma travessia de 2dias, com dormida em qualquer lado...

Abraço!!
 

Tico

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Ainda em convalescença tenho de tomar folgo só para ler a aventura, quanto mais atrever-me em pensar em vos acompanhar, fonix.
 
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